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Vista externa do Marcanã e estacionamento a noite – Foto: Cris Dissat / Fim de Jogo |
EPOCA EC: A cessão do Maracanã ao Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos Rio-2016 para a realização do evento acabou em 30 de outubro de 2016. Mas a Odebrecht, escolhida pelo governo do Estado do Rio de Janeiro para administrar o estádio, recusa-se a reassumi-lo. Ninguém assume a responsabilidade sobre o complexo esportivo – nem a construtora, nem o comitê olímpico, nem o governo estadual. O Maracanã caiu no limbo. E os prejudicados são os clubes.
Dois passos para trás para entender o contexto. A Odebrecht não quer mais o Maracanã. A construtora ficou prejudicada depois que o ex-governador Sérgio Cabral, pressionado por manifestações populares em 2013, a desautorizou de demolir equipamentos esportivos no entorno que dariam lugar a empreendimentos mais rentáveis. A renegociação entre empreiteira e governo se arrastou por mais de um ano, mas não deu certo. A Odebrecht quer ir embora.
Os Jogos Olímpicos abriram uma janela para que a situação do estádio fosse resolvida. O comitê organizador assumiu o Maracanã entre 1º de março e 30 de outubro de 2016 para organizar nele a Olimpíada. Havia oito meses para que Odebrecht e governo do Estado do Rio se entendessem sobre o futuro da concessão. A construtora pode repassá-la para outra empresa seguindo as regras vigentes, ou uma nova licitação pode ser feita com novas regras. Nada aconteceu.
Os três anos resumidos nos parágrafos anteriores culminaram na situação atual. Como a cessão do Maracanã à Olimpíada acabou, o comitê organizador devolveu o estádio ao governo do Rio. O governo, por sua vez, diz que o devolveu à Odebrecht. Mas a construtora se recusa a assumi-lo. A empreiteira alega que há contas não pagas pelo comitê no período do evento – como a conta de luz, conforme revelou ÉPOCA – e que há danos causados pelo evento no estádio.
A Odebrecht se ampara no parágrafo primeiro do termo que assinou com o comitê organizador para ceder o estádio à Olimpíada. O documento, obtido por ÉPOCA, estabelece que o prazo da cessão inclui “obras para reparação de todos os eventuais danos e avarias causados no curso do contrato”. O Maracanã precisa ser devolvido à construtora do mesmo modo que a construtora o entregou aos Jogos. A Odebrecht, então, exige um laudo técnico que ateste isso.
O governo estadual discorda. Em nota enviada a ÉPOCA, afirma que o Maracanã foi devolvido pelo comitê. “O estádio encontra-se sob a responsabilidade da concessionária Maracanã S.A”, da Odebrecht. O governo acrescenta que o contrato de cessão à Olimpíada “não prevê a apresentação de nenhum laudo, exceto o de vistoria”. A Odebrecht participou das vistorias de entrada e saída do comitê. Os reparos dos danos serão realizados até o fim do ano, pagos pelo comitê olímpico, segundo o governo, bem como o pagamento das contas atrasadas.
A pergunta-chave é a seguinte: quem arca, hoje, com as despesas do Maracanã? A Odebrecht, que se recusa a voltar, aponta o dedo para o governo. E o governo aponta o dedo para a Odebrecht. A resposta vai desagradar flamenguistas e tricolores cariocas: a conta ficou para os clubes. Flamengo e Fluminense voltaram a jogar no estádio na etapa decisiva do Campeonato Brasileiro, e o acordo inicial era de que os clubes pagariam as despesas relativas aos próprios jogos e mais um aluguel de R$ 100 mil por jogo. Mas eles têm pagado mais do que isso. Os gastos que caberiam ao responsável pelo estádio, como segurança patrimonial, limpeza e manutenção, estão sendo pagos pelos times.
No caso do Flamengo a conta é mais fácil de ser calculada. Os boletins financeiros dos dois jogos que o clube realizou no Maracanã após a Olimpíada, contra Corinthians e Botafogo, apontam para mais de R$ 570 mil em “custo de preparação” e “custo de infraestrutura” do estádio. Isso sem considerar os “custos operacionais” que também são pagos pelo clube. O Fluminense não tem linhas separadas em seus borderôs, mas confirma que tem pagado todas as despesas do Maracanã, inclusive as que caberiam ao responsável pelo estádio.
O Flamengo, por meio do departamento de comunicação, afirma que “arca com todos os custos necessários para a realização de seus jogos”. O Fluminense, por meio de sua diretoria de comunicação, informa que “enquanto permanecer a situação precária entre estado e concessionário vai operar o estádio” e absorver os custos. “Esperamos que a situação se normalize para que possamos operar sob as regras do nosso contrato”, diz o clube. O Fluminense se refere ao contrato que detém com a Odebrecht, válido por 35 anos, no qual tem direito a receitas de bilheteria e fica livre de pagar qualquer despesa do estádio. Esse contrato, assim como o que o Flamengo possui até o fim deste ano, não está sendo seguido neste momento por causa do imbróglio entre Odebrecht e governo estadual.
O limbo no qual Odebrecht e governo do Rio jogaram o Maracanã gerou um caos tamanho que, hoje, não há nem sequer contratos que formalizem a atual situação de Flamengo e Fluminense no estádio. Os clubes tinham de ter feito aditivos em seus contratos com a Odebrecht para que as regras mudassem: para que pagassem as despesas das partidas e tivessem direito a todas as receitas. Como a Odebrecht se recusa a voltar, não houve nenhum aditivo aos contratos vigentes entre ela e os dois times. Fla e Flu jogam e pagam as contas do Maracanã sem que haja qualquer trato formal.