Felipe, ex-Flamengo, afirma: "Não se pode falar o que pensa."
![]() |
Foto: Getty Images |
GOAL: Quantos jogadores sonham em vestir a camisa dos dois clubes de maior torcida do Brasil? Muitos. Quantos já tiveram essa oportunidade? Poucos.
Atualmente no Bragantino, Felipe é um dos nomes na lista desses poucos privilegiados que já defenderam Flamengo e Corinthians. Aos 32 anos, o goleiro já esteve no auge, mas por algumas escolhas que acabaram o prejudicando, ficou muito tempo sem jogar – nove meses – e até pensou em pendurar as chuteiras.
Mas como o mundo da bola dá volta, Felipe abraçou a oportunidade que recebeu no Bragantino, clube que o lançou no cenário nacional há dez anos, e em pouco tempo tendo uma sequência de jogo, foi eleito o melhor goleiro da Série A2 do Campeonato Paulista de 2016 pelo time de Bragança, está mostrando com boas atuações que pode atuar novamente em um dos gigantes da elite do futebol brasileiro, e não esconde que tem esse desejo.
Sempre muito autêntico e até tachado de polêmico por falar o que pensa, o goleiro abriu o jogo em entrevista exclusiva à Goal , e sem fugir de nenhuma pergunta, contou como está sendo o seu retorno ao Bragantino, como foi atuar no Flamengo e no Corinthians, a convivência com Ronaldo, a sua saída conturbada e o carinho que sente pelo Timão, seleção, reencontro com Andrés e o que espera daqui pra frente.
Confira como foi o bate-papo exclusivo da Goal com o goleiro Felipe!
Goal BR: Quais são suas expectativas para o ano de 2016 com o Bragantino?
Felipe: “O Principal é o acesso. No Campeonato Paulista infelizmente nós caímos antes, nas quartas de final, mas temos uma Copa do Brasil e um Brasileiro onde a gente vai brigar pelas quatro vagas, e na Copa do Brasil a gente vai tentar ir o mais longe possível. Já chegamos na terceira fase e provavelmente vamos pegar o Botafogo. Na Copa do Brasil todo ano tem uma surpresa e a gente espera ser a surpresa desse ano. Estamos com um elenco muito bom aqui, com jogadores que já passaram por grandes clubes. A equipe foi formada chegar o mais longe possível nas competições, e agora o nosso principal objetivo é acesso pra Série A.”
Quais foram as principais mudanças no clube em relação a sua primeira passagem e a atual?
“Sem dúvida foi a estrutura. Essa é a minha terceira passagem aqui, a primeira foi em 2006 e hoje, ver dez anos depois como é que está o Bragantino, mudou da água pro vinho, e ainda temos algumas dificuldades como qualquer outra equipe tem, mas antes a gente tinha a dificuldade de tudo que se pode imaginar: de material, de bola, de local pra treinar, de tudo. E agora temos o estádio que foi reformado, tem restaurante na altura do campo, temos um dos melhores gramados do Brasil. Então, fiquei muito feliz, apesar que eu não perdi muito o contato depois que eu saí, tinha contato aqui com os amigos e imaginava como é que estava, e quando eu cheguei aqui, vi como é que está o Bragantino agora, fiquei muito feliz. Tem que parabenizar o presidente pelo trabalho que ele está fazendo.”
Você jogou nos dois clubes de maior torcida do país, o que isso representa? Quais as principais diferenças que você notou entre os dois? A pressão é maior em qual?
“As duas se equivalem. A pressão da torcida é oito ou oitenta e você tem que estar bem ou estar bem. Eu fui feliz em ter conquistado título pelos dois, ganhei Copa do Brasil pelos dois, Estadual pelos dois. É difícil um atleta conseguir jogar pelos dois clubes e ganhar títulos e eu tive essa oportunidade. É uma lembrança boa que eu tenho, é uma experiência que você leva para sempre. Acho que quem consegue jogar pelos dois clubes consegue jogar em qualquer outro, e certamente nenhuma pressão vai igual a que é neles dois.”
Como era a convivência com o Ronaldo Fenômeno, tem alguma história?
“Primeiro foi um susto né (risos), ninguém acreditou quando saiu a notícia que ele ia jogar lá. A galera foi pega de surpresa e quando ele chegou também foi aquela surpresa positiva, todo mundo era fã do Ronaldo, todo atleta mais jovem, quando não queria jogar com, queria ser o Ronaldo. No videogame eu jogava sempre com ele. e quando tive a oportunidade de jogar com ele, meu armário era do lado dele, foi uma emoção muito grande, o cara foi três vezes o melhor do mundo, teve a Copa, e o apelido de Fenômeno não é à toa. Foi importante pra todo mundo daquele elenco ter jogado com ele, ter conquistado titulo, e a recuperação do Ronaldo, todo mundo dava ele como desacreditado, e a gente via o dia a dia dele treinando, se esforçando, se dedicando e aquilo foi uma coisa muito importante, poder estar junto naquele renascimento do Ronaldo foi uma época boa que eu nunca mais vou esquecer.”
Você se tornou um dos xodós da torcida do Corinthians em 2007 mesmo com o rebaixamento, mas a forma como aconteceu a sua saída mudou esse panorama. Por que você decidiu sair do Corinthians, e por que achou que aquele seria o momento certo?
“Quando o atleta sai, ele sai como culpado. Teve erro das duas partes, tanto da minha, quanto da diretoria, mas passou, não tem que ficar remoendo. Foi uma oportunidade em um momento bom, e foi aceita pelo clube normalmente, foi visto como uma boa, mas quando deu errado na negociação jogaram a culpa totalmente pra mim. Ai pro pessoal querer sair bem, é mais fácil culpar o atleta. Então eu só me arrependo de ter saído dessa forma pelo carinho que eu tenho pelo Corinthians e que os torcedores tinham por mim. Eu não imaginava sair assim brigado, mas passou, a vida seguiu pra todo mundo, eu tenho e sempre vou ter um carinho pelo Corinthians, e isso não vai atrapalhar o sentimento que eu tenho pelo clube. “
Já se encontrou alguma vez com Andrés Sanchez depois daquele episódio?
Já. Quando eu estava no Flamengo, ele sempre estava no hotel que o time concentrava. Já conversamos, eu sempre falei que o Andrés pra mim é o melhor presidente com que eu já trabalhei. Aquele problema ali foi totalmente inesperado, infelizmente foi daquela forma, como eu falei, todo mundo acabou errando, todo mundo erra e não tenho nenhum ressentimento por ele. É um cara que eu admiro pelo trabalho que ele fez no Corinthians. A gente já se encontrou depois disso, não tem problema nenhum, nos falamos normalmente.”
Você acha que os problemas extracampo atrapalharam a sua carreira? Se sentiu prejudicado em algum momento?
“No futebol não se pode falar a verdade. Você tem que falar o que o pessoal quer ouvir: ‘se Deus quiser, vamos vencer, ou podemos vencer’, você não pode falar o que você pensa, se você pensa um pouquinho diferente da maioria, falam que você é polêmico ou que você quer criar algum tumulto. A gente vê que outros atletas que falam uma coisa diferente do normal são tachados como polêmico. Então eu sempre tive a minha personalidade e sempre falei o que eu pensava. Em alguns momentos poderia ter evitado falar algumas coisas, mas no futebol você não pode ser igual a maioria, você tem que ter a sua personalidade, você pode chegar em uma entrevista e falar o que o assessor de imprensa não quer que você fale, senão era mais fácil o assessor de imprensa ir dar a entrevista do que você. Então certamente isso deve ter atrapalhado um pouco, um atleta que pensa diferente dos outros e que fala o que pensa, que não foge de alguma pergunta. Isso pode ter me prejudicado em algum momento.”
Acha que se não fosse o seu temperamento poderia ter chego a seleção?
“Mas aí não seria eu de verdade. Eu sei que tive os meus erros, mas tive os meus acertos também. E você chegar em um lugar porque você está fazendo o que os outros querem … Eu não sei se isso seria bom. Eu sei dos meus erros, dos meus acertos, da minha personalidade, sei que muitas coisas me atrapalharam, mas não me arrependo de nada.”
Entre a sua saída do Flamengo e a sua chegada ao Figueirense você ficou um tempo sem clube, treinando sozinho no Rio para manter a forma. Você em algum momento pensou em encerrar a sua carreira?
Ah… Eu pensei. Tem uma hora que você desanima, quando você trabalha e não tem nenhum objetivo onde chegar. Teve um tempo que eu pensei se valia a pena mesmo, ai você pensa, conversa, a família ajuda. Eu fiquei nove meses sem jogar e cinco meses em casa, então você acaba desanimando, não tem mais aquele ânimo de todo dia ir pro treino, você acaba pensando mesmo. Mas apareceu a oportunidade de ir pro Figueirense, mesmo sem jogar, e ai voltou a rotina de treinar, de viajar, de ter uma obrigação. Então pra mim foi legal essa oportunidade de ir pro Figueirense, porque certamente se eu tivesse ficado mais um tempo em casa, dificilmente eu continuaria jogando.
Como você está encarando essa nova passagem pelo Bragantino? Você foi eleito o melhor goleiro da Série A2, acha que é uma nova chance de dar a volta por cima?
“É como se fosse um recomeço, foi o clube que me projetou há dez anos. Mesmo eu jogando no profissional do Vitória eu não apareci tanto quanto jogando no Campeonato Paulista, então foi o clube que me projetou nacionalmente dez anos atrás, e quando houve a oportunidade de voltar em janeiro, o Marquinho (presidente do Bragantino) me ligou, a gente conversou. No início eu pensei será que vale, mas pra quem não estava jogando, o importante é jogar, e tinha a oportunidade de jogar, de voltar a ter ritmo. Fazia tempo que eu não tinha uma sequência de jogos, em lugar que eu já conheço, que o pessoal já me conhece também. Eu não jogava 20 jogos há dois anos praticamente, uma sequência que eu estou tendo aqui. Então pra mim foi muito importante essa volta, estar jogando bem, ter conquistado essa premiação que não deixa de ser legal, de ser o melhor goleiro de uma competição, de ter o nome sondado em alguns clubes no mês passado, o que mostra que o trabalho está sendo bem feito. Voltei a ser o Felipe que eu era antes.”
Desde o seu retorno ao Bragantino já surgiram supostos interesses de outros clubes, como você encara esses rumores?
“Quando você se destaca é normal ter, mas sondar é mais conversa, não chegou nada oficial pra mim, nada pro clube, mas só de ter o nome especulado pela imprensa mostra que o seu trabalho está sendo reconhecido. Se eu tivesse em casa parado certamente isso não aconteceria, e se eu tivesse mal aqui no Bragantino também não. Então quando você faz o seu trabalho correto as coisas acontecem. Eu fico feliz, mas nada que vá mudar o meu foco, que é ajudar o Bragantino, e se chegar alguma coisa, tem que chegar primeiramente no clube, pro clube ver se é bom ou não.”
Você disse que 31 anos é uma idade muito boa para um goleiro, por que você considera isso? Considera que está no seu melhor nível?
“Eu acho que é porque o goleiro já está com uma maturidade legal, já está com uma experiência boa. A gente pega como referência os principais goleiros do nosso futebol, tirando um ou outro, a maioria já passou dos 31, 32 anos. Novinho só o Paulo Vitor, mas ele também já tem 29, Martin tem 32, Cavalieri vai fazer 34, Jefferson tem 33, o Victor e Fábio também. Só tira Porto Alegre, que os dois são jovens. Você pegando a base da idade dos goleiros hoje dos principais, o Fernando Prass tem 38, Vanderlei do Santos tem 32, você tem 70, 80% dos goleiros já passaram dos 31, você vê que está todo mundo jogando bem. É a fase pro goleiro da maturidade, eu me vejo hoje nessa fase boa também, tanto técnica como psicológica pra atuar bem.”
Quais são os seus planos para a sequência da temporada? Deseja voltar a defender um grande clube?
“A gente sempre pensa em coisa melhor, em jogar na Série A, em um time de massa. Mas para que isso aconteça eu tenho que fazer o meu trabalho bem feito aqui, você não vai para nenhum lugar só por querer, tem que fazer o trabalho. E também não seria justo com o Braga, que quando eu mais precisei foi o clube que abriu as portas pra mim. Então eu vou continuar fazendo o meu trabalho aqui e se for pra acontecer, vai ser tudo no seu tempo. O que eu mais precisava era atuar e ter aquela vontade de jogar novamente e isso eu estou fazendo. Voltei, jogo feliz hoje, e o mais importante foi recuperar aquela vontade, o que tiver que acontecer vai acontecer, se tiver de sair ou de ficar eu vou estar feliz da mesma forma.”
Tem algo que você ainda sonha em realizar profissionalmente?
“Eu penso em voltar a jogar na Série A, ganhar um Campeonato Brasileiro que eu não tive a oportunidade e de jogar novamente em um time de massa, acho que todo mundo pensa. Hoje eu estou aqui no Bragantino, vou dar o meu melhor pelo Braga, e a gente sempre pensa em algo maior, mas tudo no seu tempo. Sonhar não custa nada, a gente sempre está fazendo o nosso trabalho aqui, mas sempre pensando em algo melhor, mas para esse algo melhor vir, aqui tem que estar sendo bem feito e está. Eu espero que logo logo coisas boas estejam por vir.”